Por que o comércio com a China é tão importante para o Brasil

Segundo dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), a China detém cerca de US$ 254 bilhões investidos no Brasil. O gigante asiático é nosso maior investidor externo direto.

Além disso, a China é o principal parceiro comercial do Brasil. Pequim compra cerca de 30% de todos os produtos exportados pelo País. Um fluxo de comércio internacional que, somente em 2018, gerou um superávit comercial de cerca de US$ 30 bilhões (cerca de R$ 125 bilhões).

As exportações chinesas em dezembro de 2018 obtiveram queda de 4,4% e as importações recuaram 7,6% em comparação ao mês em 2017. Por conta disso, os chinesas aceleraram e intensificaram as políticas de afrouxamento e estímulo comercial no primeiro semestre de 2019, reduzindo as tarifas de importação e exportação em mais de 700 produtos, desde minérios até medicamentos e motores.

As reservas internacionais da China cresceram em agosto de 2019, de acordo com os dados publicados pelo Banco do Povo da China (PBoC, o BC chinês). O volume total das reservas chegou a US$ 3,107 trilhões.

Entretanto, as recentes tensões comerciais entre Estados Unidos e China levaram muitos analistas a se questionar sobre quais poderiam ser os riscos para a economia brasileira. Isso especialmente por causa da admiração manifesta do presidente Jair Bolsonaro pelo presidente dos EUA, Donald Trump.

De acordo com o professor Alexandre Uehara, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos de Negócios Internacionais (CBENI) da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM – SP), por causa da guerra comercial a China poderá enfrentar reduções nos recursos disponíveis para investimentos. Isso acabaria afetando também o Brasil, pois parte do superávit comercial chinês acaba se transformando em investimentos no País.

“Eu avalio a guerra comercial como algo negativo à economia global como um todo. Com uma desaceleração da economia mundial e, obviamente, a da China, os chineses ficarão mais criteriosos em suas escolhas de investimentos. Se pegarmos os dados de 2017 e 2018, os investimentos sofreram redução, na minha opinião, por terem ficado mais criteriosos em relação ao investimento no exterior, até porque se a China crescer menos, investirá menos no exterior”, disse o professor para o SUNO Notícias.

Além disso, Uehara salientou que, além das vantagens evidentes dos investimentos asiáticos, existem pontos críticos com a presença de empresas chinesas no Brasil. “Precisamos de investimento em áreas como construção civil, e nesse aspecto o poder chinês é positivo. Por outro lado, não temos uma experiência a longo prazo para sabermos como será o comportamento dessas empresas no futuro. O mundo inteiro está ainda aprendendo a trabalhar com essas empresas chinesas”, explicou o professor da ESPM.

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Sobre eventuais turbulências geradas por decisões políticas, Uehara explicou que os chineses investem no Brasil a longo prazo, sem se preocupar muito com o governo atual. “Como as empresas chinesas são capitalistas, elas estão aqui para obter lucro. As declarações do presidente Bolsonaro afetam mais ao governo chinês, o que também pode tornar mais tímidos os investimentos principalmente em infraestruturas, pois são de alguma maneira influenciados pelo ambiente político e diplomático. Mas os investidores que já estão aqui, raramente sairão do país, afinal, são muito pragmáticos e não deixarão de ganhar dinheiro por conta de alguma declaração do presidente”, disse Uehara.

“Queremos ter parceiros no mundo inteiro”, diz Charles Tang

O interesse de longo prazo das empresas chinesas no Brasil foi salientando também pelo presidente binacional da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCIBC), Charles Tang.

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O executivo foi muito claro ao dizer que a China não tem como objetivo explorar os países onde investe. Ao contrário, quer levar adiante um sistema de cooperação, visando o engrandecimento de ambas as nações envolvidas.

“A China investe no mundo inteiro. A China ajudou a África a se tornar um continente de esperança com as maiores taxas de crescimento. A infraestrutura é a base de uma economia forte de qualquer país desenvolvido. E uma das coisas que no Brasil faltam é em infraestrutura”, salientou Tang.

Na entrevista, também foram abordados temas como:

  • o interesse a longo-prazo da China no Brasil
  • o que muda com o novo governo e com a guerra comercial
  • os setores que a China mais investirá no Brasil

Sobre a hostilidade que o presidente Bolsonaro demostrou em várias ocasiões contra a China, seja durante a campanha eleitoral de 2018, seja durante os seus primeiros nove meses de governo, Tang foi muito explícito: “o presidente Bolsonaro deveria na verdade dar uma medalha pra China”.

“Isso pois na pior crise econômica brasileira, investimos US$ 15 bilhões no País. Emprestamos mais US$ 15 bilhões para a Petrobras. Além disso, investimos em um fundo de investimento para infraestrutura em parceria com o Brasil em que demos US$ 20 bilhões enquanto o Brasil aportou apenas US$ 5 bilhões. A China quer ganhar e ajudar os outros países ganhem também. Queremos ter parceiros no mundo inteiro”, salientou Tang.

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O presidente do CCIBC também deixou claro o interesse da China no Brasil a longo-prazo: “Temos interesse em ajudar o Brasil, ampliar a infraestrutura, entre outras coisas. Nós também investimos em energia elétrica, petróleo, gás, saneamento, ferrovias, portos e rodovias”, explicou o executivo.

“A guerra comercial não começou e nem vai terminar com Trump”

Tang não se mostrou preocupado sobre a posição do Brasil na guerra comercial. Entretanto, salientou os riscos de uma posição antagônica do País em relação ao parceiro asiático.

“Uma das belezas do Brasil, é que ele é amigo de todo mundo. O Brasil nunca teve inimigos, ao menos nunca tinha. Além disso,  não pode esquecer que a economia brasileira com a chinesa são complementares, enquanto a brasileira com a norte-americana são concorrentes. Quando a China compra mais do Brasil, compra menos dos EUA. China é mercado, Brasil e EUA são fornecedores”, explicou o executivo.

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“O benefício para o Brasil é de longo-prazo, pois a China precisa de parceiros confiáveis que não cortarão o fornecimento quando o presidente acordar de mal humor. Os chineses não podem passar fome só porque o Trump acordou de mal humor. A confiança é como um vaso, quando quebrado, é muito difícil colar novamente. Logicamente, num acordo entre EUA e China, iremos comprar mais dos EUA e menos do Brasil”, disse Tang.

O executivo chegou a fazer uma previsão sobre a guerra comercial: “ela não começou com Trump e nem vai acabar com Trump”.

“O Obama quando fez o pivô dele para a Ásia pacífica era pra conter a China. Quando criou a Parceria Trans-Pacifica (TPP, na sigla em inglês), um acordo de livre-comércio no quintal da China e sem a participação chinesa, é claro que foi para conter a China”, disse Trump.

Futuros investimentos da China

O presidente do CCIBC esclareceu que: “a China continuará investindo em energia, principalmente agora que a Eletrobras venderá ativos dela, continuará com investimento em Petróleo e Gás. Além disso, quer fazer a termoelétrica de gás natural da Coperj. Trabalhamos muito com termoelétrica de lixo, para ajudar os prefeitos do Brasil, que estão todas fora da lei. Além de trabalharmos com projeto de cidades inteligentes, no Rio de Janeiro, por exemplo, tem 450 mil iluminarias de LED, 10 mil câmeras em alta resolução, tudo para dar wifi pra todo mundo, sinais, propagandas, segurança, semáforos sequenciais, entre outras coisas.”

Rafael Lara

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